NA PORTA do hospital em que Neymar foi operado – ato-falho, tinha escrito hospedado – o bando de fãs acampa com cerveja, pagode e barulhos variados, inclusos os ventosos. Era a casa de Neymar? Não, era o prédio de pessoas doentes, que têm no silêncio o complemento do repouso, dois auxiliares da cura. Coisa normal, a barulheira, é do Brasil, onde a palavra respeito não se ensina em casa, nas escolas, esquecida no dicionário. Aliás, a última vez que a ouvi foi da velha mandachuva da repartição com quem reclamava do serviço, maior de nossas faltas de respeito, o desrespeito pelo Estado: “Respeito é bom, e eu gosto”. É onde subsiste o respeito, no patrimonialismo da nomenclatura.
Entre nós o respeito cede para o temor. Respeito é sinônimo de medo, necessidade de ficar bem com quem manda e de quem precisamos para variados interesses. No geral não é desinteressado, genuíno. Funciona como irmão gêmeo, no parentesco mais distante, primo-irmão, do interesse. Nós brasileiros não vemos o vizinho, o concidadão, a velhinha da rua e o catador de lixo como semelhantes; nem chego à falsa retórica religiosa do ‘irmão’ porque a primeira lição da falta de respeito tomamos com ou aplicamos aos irmãos. Empatia, outra virtude associada, que qualifica o respeito, entre nós é o erudito de simpatia, não é capacidade de replicar na alma a verdade do semelhante.
E simpatia, ora, entre nós a simpatia é irmã ou distante prima-irmã do interesse, a pessoa simpática nos cativa – não raro está interessada em tirar algo de nós. Falo do antipático? Não precisa, todos sabemos quem é, como é, este que escreve é um deles, Roberto Requião, outro. Volto ao hospital do Neymar, ao barulho no hospital do Neymar. Não fossem os outros doentes, tanto dos andares exclusivos como do utilizado pelo craque, por Bruna e pelos parças; tem os da UTI e CTI. Neymar não merece a barulheira, mesmo sendo criança mimada e também pagodeiro. Ninguém merece. Hospital, local de recuperação, exige silêncio, até sussurros. Exigência que se estende à rua e à vizinhança.
Tem o hospital e as clínicas aqui da redondeza. Um crápula queima pneus da Kawasaki Ninja e a acelera ao máximo quando lhes passa pela frente. Duas, três vezes ao dia. Sem contar os motoqueiros-entregadores, condutores das pizeras, grande parte produto de furto e com placas falsas. Perguntei à tiriva, o apelido que demos à senhora de verde que nos multa pelo estacionamento, ‘é infração, não tem multa?’ Sim, me responde, mas a prefeitura não nos fornece o aparelho de radar; esse pessoal até faz mais barulho quando nos vê. ‘Não entendo’, eu de novo, ‘a prefeitura ganharia mais dinheiro em multa de barulho que em multa de estacionamento’. Don Rafael e Doña Margarita, que odeiam barulho, podiam pensar nisso.