Um mundo de papel

“O senhor imagina o que é isso para uma pessoa moça que se esforça para melhorar de vida? As taxas pagas, o dinheiro dos professores, das passagens, o tempo perdido, a decepção…”

A história que essa carta me conta é triste e banal. Houve um concurso para escriturário de determinada autarquia. A moça inscreveu-se, tomou cursos, estudou meses, fez as provas, foi aprovada, foi classificada, chorou de alegria quando a mãe a beijou, ficou esperando a nomeação, passaram-se dois anos, ela não foi nomeada e o concurso não vale mais.

O Estado, no Brasil, é um brincalhão.

Um homem me conta história idêntica: “gastei tempo, dinheiro e saúde, passei noites em claro, fiquei até doente dos olhos… deixei de levar minha filhinha a passear aos domingos… tudo em troca de nada… sou um ‘otário’…”

O pior é que os dois me pedem conselho. Só posso dizer que continuem a se esforçar e a ser bonzinhos, pois Deus protege os inocentes. Ou então o remédio é nascer outra vez, em uma família conveniente. Eu poderia fornecer aqui o nome de algumas famílias convenientes, isto é, famílias onde as mocinhas e os rapazes são nomeados, sem concurso nenhum, para cargos esplêndidos.

É verdade que há sujeitos admiráveis que, mesmo não pertencendo a essas famílias, conseguem coisas impressionantes. O diabo é que eles não revelam sua técnica. O DASP deveria requisitar um desses cavalheiros e encarregá-lo de escrever um livro no estilo de Dale Carnegie: Como Fazer Amigos e Arranjar uma Galinha-Morta no Serviço Público Federal.

RUBEM BRAGA, em ‘Ai de ti, Copacabana

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